terça-feira, 12 março 2024 08:43

(In memória, Janeiro de 2021)Nelson Mafambane: “Com os meus anitos vou coxeando para o último adeus”

Gilberto Guibunda/Foto: José Zangado
MAFAMBANE REDUZIDONelson Rogério Mafambane, de seu nome completo, nascido há 77 anos, no Distrito de Magude, é uma figura de consenso quando de futebol se discute. O seu legado, primeiro como jogador e depois como treinador do Clube Ferroviário de Maputo, fizeram com que o procurássemos para tirar algumas linhas das já roncas cordas vocais, sinal de que a idade e o tempo começam a pesar.

Encontrámo-lo bem disposto  em sua casa já pronto para a conversa, no Bairro Patrice Lumumba, no Município da Matola e, sempre afável, ainda graciou-nos com um “welcomedrink” que segundo o interlocutor, é condição sine qua non para todo visitante. Logo a entrada perguntou-nos do nosso interesse com um velho já há muito retirado do mundo da bola pelo que respondemos que estava totalmente enganado, pois, se fomos ter em sua casa, é em reconhecimento do que deu ao futebol nacional.
Seguiu-se a história, a sua história contada na primeira pessoa para descrever os primeiros tempos do rico percurso de vida.
–“Por razões profissionais do meu pai, que era enfermeiro, cresci em Xinavane. No entanto, eu nasci no dia 24 de Fevereiro de 1943, no distrito de Magude. Foi em Xinavane que tudo começou os primeiros anos de liceu e futebolístico, onde actuava no Clube de Incomáti. Foi aqui que o Ferroviário de Lourenço Marques me veio recrutar para jogar nas camadas inferiores. Já não me recordo com precisão olheiro responsável pela minha transferência e lamento que nos tempos que correm os jovens não tenha a mesma sorte. Na altura quando Mário Esteves Coluna e Eusébio da Silva Ferreira vinham para cá de férias, diziam-nos o que nós devíamos conversar. Igualmente tínhamos um professor, Mirandela da Costa, nosso preparador físico, desempenhou um papel importante na minha integração no Ferroviário”, recorda Mafambane, de memórias ricas as quais parte delas quis connosco partilhar.
– “Das memórias que guardo enquanto jogador foi quando fui levado para integrar a Selecção de juniores de Portugal onde fiquei durante três meses. Fiquei estupefacto com as condições de trabalho que vi, dos vários exames submetidos e aqui, ainda me lembro do médico que me observou, o doutor Silva Rocha, que era do Belenenses. Aliás, tornei-me adepto da equipa de Belém por influência deste grande senhor. Nós, íamos participar do campeonato europeu na Roménia. Jogava a médio e conheciam-me por ser forte no remate a distância. Infortúnio foi que neste torneio tive o azar porque numa das jogadas e a preparar o remate, um adversário meteu o pé e lesionei-me com alguma gravidade. O nosso meio campo ressentiu-se da minha ausência, mas prontos, foi um momento que marcou a minha vida”, conta.
–“De regresso a casa fui admitido nos Caminhos-de-Ferro primeiro como aprendiz na carpintaria. O meu falecido pai queria que eu fosse enfermeiro, mas por aquilo que eu observava do trabalho que ele fazia, onde não tinha hora para atender os necessitados, recusei a seguir a profissão dele. Disse que podia fazer tudo menos essa profissão. Era preciso ter um grande coração, não porque eu não tinha, apenas senti que não podia fazê-lo”, lamenta o também antigo treinador responsável por forjar grandes talentos que passaram pela formação do Ferroviário.
–“Não posso mentir, por serem tantos, já não me lembro da maioria dos “miúdos” (assim designa os seus antigos jogadores) que passaram das minhas mãos. A satisfação é que alguns deles sempre que podem telefonam e alguns vêm para minha casa para saber da minha saúde”.
Conviveu com muita gente, como jogador assim como quando decidiu abraçar a carreira de treinador. Neste último, é o magriço Hilário da Conceição que pretende abordar.
–“Hilário José da Conceição era uma pessoa espontânea e extraordinário. Quem não quisesse cumprir com as suas ordens ele não tinha receio de lhe retirar dos trabalhos. Recebi-o ele e a sua falecida esposa em minha casa …!”
Falar do seu Ferroviário é trazer-lhe à memória a vida feita, os lugares vividos e passados, enfim, as pessoas e amizades realizadas.
–“Quando penso no clube só sinto nos meus colegas, falo dos treinadores, que devem ser valorizados, devem ser respeitados porque desempenham um grande papel na socialização dos miúdos que podiam estar nas drogas ou outros males. Lembro-me que quando trabalhava nas camadas inferiores, a partir da minha casa preparava as refeições para os meus meninos. Quando fui treinar por exemplo a equipa de Águia D’Ouro, o próprio presidente, Alcídio Carvalho, ficou entusiasmado com esta prática que influenciou com que a equipa galgasse colossos da capital. Para dizer que é preciso respeitar os que andam no desporto e apoiar as pessoas que estão na frente desse mesmo desporto.
A única coisa que me dói é que, enquanto eu andava a jogar e a trabalhar, o que me possibilitou adquirir o património que tenho, pedi que fosse fogueiro dos comboios a carvão. Engoli muitas vezes cobras e sapos dos maquinistas brancos, que vezes chamavam-me de macaco em jeito de deselegância do meu trabalho. Este desprezo deixou de acontecer quando foi de regresso de Portugal porque, fui ver de perto a realidade que lá se vivia. Não vou dizer estou magoado com eles, simplesmente lhes peço para que sejam pessoas com um perfume de perfil de olharem e saberem das outras pessoas que deram ou dão a vida pelo clube.
Com os meus anitos, já vou coxeando para o último adeus vou seguindo dia-a-dia e acompanhando a vida do clube por intermédio dos amigos que me vêm contar ou pelos meus filhos que acompanham pela televisão”.

Read 1188 times

Participe de todos os jogos e torne-se um verdadeiro adepto.

Saiba mais

Galeria de Fotos

Palmarés

  • Campeonato nacional futebol masculino

    10

    Campeonato Nacional Futebol Masculino

  • Taça de Moçambique

    6

    Taças de Moçambique

  • Campeonato Nacional de Hóquei

    13

    Campeonato Nacional de Hóquei

  • Campeonato Nacional de Basquete

    6

    Campeonato Nacional de Basquete Feminino

  • Campeonato Regional

    3

    Campeonato Regional

  • Campeonato nacional futebol feminino

    5

    Campeonato Nacional Futebol Feminino

  • Campeonato Nacional de Basquete Masculino

    3

    Campeonato Nacional de Basquete Masculino